Bem-vindos os médicos
Profissional cubano não virá ao Brasil para concorrer com a medicina de mercado, mas para tratar de problemas que podem reduzir a mortalidade em regiões onde poucos querem trabalhar
O Conselho Federal de Medicina (CFM) ficou indignado frente ao anúncio do governo brasileiro de que pretende trazer 6 mil médicos de Cuba e outros tantos de Portugal e Espanha para atuar em municípios carentes de profissionais da saúde. Mas a opinião do conselho importa menos que a dos habitantes das periferias e do interior do país, que tanto necessitam de cuidados. Estudos do próprio CFM, em parceria com o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), demonstram que em 2011 o Brasil dispunha de 1,9 médico para cada mil habitantes. Cuba dispõe de 6,4. Em 2005, a Argentina contava com mais de 3 médicos para cada mil habitantes, o que o Brasil só deve alcançar em 2031.
Dos 372 mil médicos registrados no Brasil, 209 mil se concentravam nas regiões Sul e Sudeste, enquanto pouco mais de 15 mil na Norte. (O Brasil oferecerá vistos de trabalho de dois a três anos para profissionais dos três países que queiram realizar atendimento em cidades carentes na área da saúde.)
Se a medicina cubana fosse de má qualidade, como se explica a saúde daquela população apresentar, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), índices melhores que os do Brasil e comparáveis aos dos Estados Unidos? No ranking da OMS, dados de 2011, o melhor sistema de saúde do mundo é o da França. Os Estados Unidos ocupam o 37º lugar e Cuba, o 39º. O Brasil está em 125º. Cuba, especialista em medicina preventiva, exporta médicos para 70 países. Graças a essa solidariedade, a população do Haiti teve amenizado o sofrimento decorrido do terremoto de 2010.
Médico cubano não virá para o Brasil para emitir laudos de ressonância magnética ou atuar em medicina nuclear. Virá tratar de verminose, diarreia, malária, desidratação, reduzindo as mortalidades infantil e materna, aplicando vacinas, ensinando medidas como cuidados de higiene. O New England Journal of Medicine elogiou a medicina cubana, que alcanças as maiores taxas de vacinação do mundo, “porque o sistema não foi projetado para a escolha do consumidor ou iniciativas individuais”. Em outras palavras, não é o mercado que manda, é o direito do cidadão.
Quem dera um dia o Brasil pudesse expor em suas cidades um cartaz como o que vi em Havana: a cada ano, 80 mil crianças no mundo morrem de doenças facilmente tratáveis: nenhuma delas é cubana.
Por: Frei Betto
Fonte: Rede Brasil Atual